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Despedida de Júlia é um dos velórios mais tristes que Brasília já viu

Familiares e amigos perplexos se despediram da menina de 2 anos assassinada na quinta-feira. O município goiano de Padre Bernardo parou para acompanhar o enterro. A avó materna fez apelo para que parassem de julgar a filha, que confessou o crime


Um caixão pequeno, branco, com um sapo de pelúcia ao lado. A cena de afeto e tristeza diante de uma morte precoce abalou dezenas de pessoas no velório de Júlia Felix de Moraes, de 2 anos e 2 meses. O corpo da menina — assassinada na quinta-feira, na quitinete onde vivia com a mãe e com o pai — chegou ao Cemitério de Padre Bernardo (GO) às 8h e foi colocado na capela. O município goiano, distante 120km do centro de Brasília, parou, atônito com a tragédia. Alguns não conseguiram permanecer no local. Saíram para recuperar o fôlego.


Entre os familiares por parte de mãe, tristeza e incredulidade. Na família paterna, dor e revolta. Além do luto, os parentes manifestaram indignação com a crueldade do assassinato da menina, que foi asfixiada e esfaqueada duas vezes no peito. A mãe, Laryssa Yasmin Pires, 21, confessou o crime e responde por homicídio duplamente qualificado.


A avó materna de Júlia, Luciana Pires, 37, segue descrente, e desabafou, dizendo que a filha vai pagar pelo crime e que não precisava ser atacada. Ainda em choque, o pai da criança, Giuvan Felix, mantinha o olhar fixo na direção do caixão. As mãos do jovem de 25 anos demoraram a sair de cima da madeira. Como se não estivesse ali, ele recebia abraços de conforto, sem dizer uma palavra.


A todo momento, sentada ao lado do caixão, Luciana agarrava forte o brinquedo de pelúcia da neta e orava por ela e pela filha, que passava por audiência de custódia em Brasília. “Nenhuma mãe mata uma filha porque quer. Ela amava a bebê. Eu sei que ela está errada e vai pagar, mas queria que ninguém a julgasse, porque só Deus sabe o que aconteceu naquele momento e só Ele pode condenar. Não podemos pagar o mal com mal”, desabafou.


Amigo de Luciana, Elton Gonçalves, 39, deu forças à família. “Já perdi um filho de 1 ano de idade e só quem passa por isso sabe a dor. A gente acaba vendo a criança em todo canto da casa, é muito triste. Falei para ela (Luciana) que não vai ser fácil, principalmente porque ela era uma avó muito próxima, que amava a Júlia, mas o tempo vai cicatrizando”, disse o vendedor. Elton conta ainda que Laryssa teve uma boa educação, de uma mãe batalhadora, que sempre deu tudo o que a filha precisava, mas a garota acabou “escolhendo o caminho do mal”.



Entre canções

A cerimônia foi conduzida pela pastora Tany Vasconselos, da Igreja Plenitude de Graça, onde a avó da criança congrega. Entre choro e suspiros de angústia, era possível escutar os cânticos evangélicos: “E se eu passar pelo vale / Acharei conforto em Teu amor / Pois eu sei que és aquele / Que me guarda, me guardas / Em Teus braços é meu descanso”. A canção de Laura Souguellis trazia um pouco de consolo.

“A dor é muito grande, mas Deus é o consolo nessas horas. Ele proporcionou um presente muito especial para essa família, que foi a Júlia. Mas Ele quis tê-la de volta. Agora, ela está nos braços do Pai. Não devemos condenar ninguém. Nosso papel é pedir para que Deus conforte toda a família em meio a um momento de tanto sofrimento”, destacou a religiosa. Às 10h, o corpo foi enterrado.


Relatos e lembranças

Familiares e amigos de Laryssa a descrevem como uma pessoa amorosa, e só puderam acreditar no assassinato após ver o corpo da pequena Júlia. Para a tia da suspeita, Linda das Graças, 61, a jovem se “perdeu” após atingir a adolescência. “Ela foi criada dentro da nossa casa também e, desde muito nova, demonstrava ser amorosa. Mas quando ficou mais velha, se perdeu no caminho das trevas. Mesmo assim, nunca poderia imaginar que ela pudesse ser capaz de cometer um ato tão brutal. É muito difícil para todos nós, mas o tempo vai amenizar. Quem mais sofre com toda a situação é a Luciana, que perdeu a neta, mas também perdeu a filha, que ficará presa pelo crime”, lamentou a aposentada.

Uma ex-professora de Laryssa, que preferiu não se identificar, relatou que a jovem era empenhada nos estudos. “Contudo, ela acabou se envolvendo com as pessoas erradas. Passou a consumir bebidas alcoólicas com frequência, assim como drogas. Claro que não podemos determinar que essa foi a motivação para o crime. Mas, desde que ela tomou essas atitudes, se transformou”, afirmou.


Conforme apuração do Correio, Laryssa teria escondido a gravidez de Júlia de toda a família, inclusive da mãe. “A Luciana só soube quando ligaram para ela do hospital, avisando que ela tinha ganhado a menina. Foi um choque, mas algo que trouxe muita felicidade para a Luciana. Mas por causa de ter sido tudo escondido, foi preciso fazer doações para que a pequena tivesse até roupinha para sair da maternidade e seguir para casa”, disse outra fonte que não quis se identificar.

O bisavô de Júlia, o pedreiro Jair da Silva Lopes, 65, relembrou a alegria que a menina trouxe para toda a família. “Foi um momento extraordinário para todos nós. Ela era uma criança esperta, cheia de vida e muito especial. Eu estava no serviço quando meu sobrinho ligou e disse o que tinha ocorrido. Não quis acreditar. Mesmo assim, saí de casa e vim direto para cá (Padre Bernardo)”, relatou o morador de Goianésia.


Tia-bisavó da menina, a aposentada Zilda Maria da Silva, 74, também viajou até o município goiano para acompanhar a cerimônia. “É triste demais para toda a família, ainda mais como tudo ocorreu. A gente tenta encontrar forças em Deus para continuar, não espera que na nossa família ocorra uma barbaridade tão grande”, refletiu a moradora de Santa Maria.


Indignação

“A pior coisa que poderia acontecer, aconteceu. Para mim, a mãe agiu como um monstro e, agora, o pai está ali chorando no caixão da filha.” A fala de revolta é de Maria dos Reis, 40, tia do pai de Júlia. A dona de casa conta que a relação do pai com a criança era de muito amor. “Julinha era uma bebê feliz, que gostava da vida e adorava abraço. O pai dela era louco por ela, tinha carinho e cuidado. Era o fim do mundo para ele se a menina escorregasse”, lembrou.

Maria ainda disse ter ficado em choque com as acusações de Laryssa contra o pai da criança. “Ele é um rapaz sensível, amoroso, que não matava uma barata. Estudou, fez faculdade e trabalha muito, chegando tarde em casa todo dia. Quem tentar apontar o dedo para ele, está mentindo”, afirmou. A tia também contou que o rapaz é pai de outra criança, de cerca de 1 ano, fruto de outra relação. “Mesmo não morando com a mãe, ele sempre teve muito respeito. A gente espera que ele consiga se levantar e cuidar da outra bebê”, destacou.

Alan Rios e Sarah Peres do Correio Brasiliense

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